Quando dinheiro não é a solução

Época de copa, as ruas de São Paulo (e imagino que do Brasil) estão tomadas por festa. O que eu acho ótimo. Eu adoro ver as pessoas felizes e celebrando algo em comum. O problema é que eu resolvi morar no meio da bagunça. A região que eu moro já é movimentada em situações normais e virou um verdadeiro carnaval na época da Copa.

Em uma dessas noites que eu não estava conseguindo dormir por conta do barulho nas ruas, eu comecei a me desesperar e pensar que precisaria morar em um bairro mais nobre de São Paulo. Afinal de contas, no Jardim Europa, repleto de casas chiques e zero comércio, não deve haver barulho.

No dia seguinte fui almoçar com uma amiga que comentou que São Paulo é engraçada. O prédio que tem o metro quadrado mais caro de São Paulo, estava com água até o joelho por conta das chuvas. E foi aí que eu lembrei que na noite anterior eu caí numa falácia comum: achar que ter dinheiro resolve todos os nossos problemas.

A filosofia Bastter de “jogue dinheiro no problema” é ótima. Quando você está brigando com seu marido sobre quem vai fazer a faxina de casa, jogar dinheiro no problema e contratar uma faxineira é uma ótima solução. Ou quando você perde um voo porque você não viu o e-mail informando do cancelamento. Comprar uma passagem nova (jogar dinheiro no problema) é melhor do que cancelar as férias por inteiro.

Mas jogar dinheiro no problema é diferente de achar que dinheiro resolverá todos os seus problemas. Eu adoro assistir aos documentários curtos no Youtube de revistas como The Economist e o Financial Times para me informar. E recentemente assisti ao documentário que explica a crise do banco Credit Suisse. E qual não foi minha surpresa ao descobrir que tudo começou com uma briga de vizinhos. O CEO do banco ficou puto porque o seu vizinho, que era também o seu subordinado, estava tocando uma obra gigante super barulhenta dia após dia. A crise entre os vizinhos foi tão grande que acabou ocasionando na demissão do CEO. É claro que não foi só isso que ocasionou a crise no banco. Mas foi a primeira de uma série de mudanças no comando da empresa, que acabaram deixando o banco como um trem desgovernado, e que eventualmente caiu na crise de hoje.

Essa história foi um sinal de alerta para mim. Eu sempre tive dificuldade de lidar com barulho, mesmo quando morava em um bairro mais isolado da capital. E nas noites de desespero, pensava que a única solução seria me mudar para a Suíça. Dizem que lá é proibido até mesmo dar descarga de madrugada para não incomodar os vizinhos com barulho. Mas o custo de vida na Suíça é um dos mais altos do mundo, o que me fez pensar erroneamente que se eu tivesse dinheiro para viver na Suíça, aí sim meu problema com barulho seria resolvido. Depois que eu descobri que até mesmo o CEO de um dos maiores bancos da Suíça teve problema com barulhos, eu lembrei que dinheiro realmente não é a solução para tudo.

Essa provavelmente é a maior causa de frustração das pessoas. Você acredita que quando for rico, será feliz e todos os seus problemas sumirão. Então você se mata de trabalhar por dinheiro. E quando finalmente fica rico, você percebe que nem todos os problemas foram embora. É realmente frustrante. 

Quando jogar dinheiro no problema não funciona, eu recorro a Oração da Serenidade. Não sou religiosa, mas carrego essa oração comigo há anos. Ela diz “que eu tenha serenidade para aceitar aquilo que não posso mudar, a coragem para mudar o que me for possível e a sabedoria para saber discernir entre as duas”.

Eu não controlo quando o vizinho dará uma festa, mas eu posso controlar o som que entra no meu ouvido. Em uma noite de desespero eu encontrei o blog do Dorminhoco. Uma pessoa que adora dormir e que também sofre quando o barulho alheio incomoda seu sono. E graças ao blog eu descobri uma combinação de protetor auricular com SleepPhones. Resolvi testar e o resultado foi positivo. Até mesmo aquele som grave do batidão do funk passa despercebido. E é uma solução muito mais barata do que me mudar para a Suíça.

Além da oração da serenidade, também carrego comigo a sabedoria de que não se pode ter tudo na vida. Sempre lembro de uma amiga que incomodada com tanta notícia ruim sobre a violência em São Paulo, decidiu mudar de país. Ela conseguiu ser expatriada para Londres. No segundo mês que estava lá aconteceu o ataque terrorista na London Bridge, que ficava próxima a casa dela. Eu sei que as estatísticas mostram que Londres é uma cidade mais segura que São Paulo. Mas pouco importou as estatísticas quando ela sofreu um evento com 0,01% de probabilidade de acontecer. Foi aí que ela percebeu que só mudou de país por medo da violência. E que ela abriu mão de todo o resto que gostava em São Paulo por apenas uma coisa que não estava garantida em Londres. Ela voltou para São Paulo e está mais contente com a decisão.

Morar numa região central de São Paulo me traz coisas boas. Me permite gastar menos com transporte, me permite acesso rápido a três dos melhores parques da cidade, e viver uma vida cultural intensa. Mas como não tenho dinheiro para viver numa região apenas residencial, eu tenho que dividir meu espaço com centros comerciais barulhentos. É o preço que eu pago.

Eu entendo o CEO do Credit Suisse ter perdido a cabeça por conta do barulho, o que levou a sua demissão. Deve ser muito frustrante você trabalhar a vida toda, abrir mão de tanta coisa para chegar no topo de um dos maiores bancos do mundo, achar que é Deus e ter que sofrer com barulho de obra do vizinho como os pobres mortais. Mas para algumas questões da vida, todos somos pobres mortais. E não tem dinheiro no mundo que resolva.

8 respostas

  1. Oi Aposentada aos 30! Conheci seu blog hoje. Estou adorando seus textos. Acredito que eu já seja FIRE, só me falta a audácia para virar a chave. Continuarei lendo seus textos para me inspirar ainda mais.

  2. ” E quando finalmente fica rico, você percebe que nem todos os problemas foram embora”
    Achei otimo o seu texto! O ser humano é um eterno insatisfeito, quando consegue alcançar o topo de uma montanha, cobiça escalar outra mais alta….
    Com o dinheiro, surgem problemas que antes vc não tinha. Conheço uma pessoa muito rica, veio de familia classe média, batalhou muito, e como tinha expertise, construiu grande fortuna (dona de uma rede de franquias). Mas hoje ela e a familia são prisioneiros na propria casa. Já tentaram sequestrar ela, os filhos, até a mãe! E ela responde por um monte de processos trabalhistas, tem o estresse de todo dia tomar decisões, fazer reuniões, consultar advogados e manter os negocios no prumo.
    Não que ter dinheiro seja ruim. Mas vc deve se manter abaixo do radar…
    um CEO de uma grande empresa disse: “Eu trabalhei 80 horas na semana por 40 anos com um objetivo: para que meus filhos nunca tivessem que fazer isso”. E então ele acrescenta: “Essa foi a pior coisa que eu poderia ter feito para mim mesmo, para minha esposa ou para meus filhos.
    A vida é essencialmente a caminhada (que você faz para chegar ao ponto final, ao seu objetivo). Deve-se aproveitar a paisagem, parar quando tiver vontade, deixar boas obras pelo caminho..

    1. Adorei seu comentário, e trouxe pontos extras.
      Também vejo pessoas com muito dinheiro que tem novos problemas por conta do excesso de grana. Isso deve ser ainda mais frustrante. Trabalhar tanto, juntar tanto e perceber que agora tem coisas novas para se preocupar!

  3. Infelizmente é verdade. Só existe uma saída para todos os problemas e a grande maioria não quer, mas sinceramente ja estou pensando: MORTE!

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