Algemas de ouro

Vira e mexe eu converso com amigos que estão presos por algemas de ouro e não percebem. Essa semana ouvi de um amigo “de que adianta viver com pouco e não curtir a vida?” Ele tinha acabado de voltar de um resort de luxo no Caribe. “Isso sim é que é aproveitar a vida”, ele dizia. Nem preciso dizer que esse amigo ainda trabalha 60h por semana, sem contar o trajeto de deslocamento de mais de uma hora porque preferiu morar longe, mas numa casa enorme. Afinal, isso é aproveitar a vida.

É natural do ser humano querer mais e mais conforto. O conforto é conveniente e nós somos seres preguiçosos por natureza. Mas é curioso ver como livros que te ensinam a ter mais foco e ser mais produtivo estão em alta. Dada a oferta desses livros, imagino que a demanda é enorme também. Então a gente quer ser mais produtivo, só não sabe como.

Nessa luta entre a preguiça e a produtividade, muitos se perdem no caminho do conforto sem saber que é exatamente esse o problema.

Se hospedar em um hotel luxuoso provavelmente vai te fazer querer ficar mais tempo na cama ou no quarto vendo TV. Enquanto a vida e as experiências mais incríveis estão lá fora. Enquanto você está dormindo em um quarto luxuoso de hotel, você não está curtindo a vida. Você está descansando, apenas.

“O hotel tinha uma piscina maravilhosa”. Sim, e a casa dele também tem. Por que a piscina fascina tantas pessoas quando ela está em um site de agência de viagens enquanto a piscina do prédio vive vazia?

O equilíbrio das férias de luxo de preguiça com um trabalho para pagar as contas é improdutivo por definição. São poucas as pessoas que se sentem realmente produtivas com um emprego CLT. A grande maioria está lá só para pagar as contas. E gastar a vida em um emprego infeliz suga toda a nossa energia vital. Aí precisamos de férias incríveis para recuperar essa sensação de vida. Só que essas férias incríveis precisam do emprego infeliz para pagar as contas. O ciclo é infinito. E não há espaço para produtividade e vitalidade nesse ciclo.

Essa vida de luxo tem um custo. As pessoas acham que tem que mirar uma vida de luxo e acabam perdendo a vida em si. Sim, eu também preferiria ficar hospedada em um hotel 5 estrelas ao invés de um hotel 2 estrelas. Mas o hotel 5 estrelas tem um preço. Se você é herdeiro e pode bancar o hotel 5 estrelas sem precisar trabalhar, então faça bom proveito. Mas se você ainda precisa trabalhar para pagar o hotel 5 estrelas, então você está desperdiçando a vida.

De que adianta viver com pouco? Viver com pouco é a fórmula para a grande maioria das pessoas (os que não herdaram uma fortuna) para finalmente viver a vida. Sim, talvez você tenha que ficar em hotéis mais baratos. Talvez você tenha que carregar seu próprio isopor para a praia. Talvez você tenha que viajar apertado na classe econômica. Mas a única alternativa para evitar isso é perder a vida trabalhando por dinheiro.

Essa é uma verdade que é difícil de encarar. Então as pessoas ainda acham que podem ter tudo. A vida e o luxo. Como se fosse possível viver a vida intensamente enquanto você ainda trabalha para pagar as contas.

Eu deveria ter corrigido meu amigo e dito “de que adianta gastar muito e curtir apenas 5% da vida?”. Você pode optar por ter 15 dias de férias de fazer inveja no Instagram. Mas são só 15 dias. Nos outros 350 dias do ano você está preso no trabalho. É menos que 5% do ano. O que você preferiria? Se aposentar aos 30 anos de idade e ter mais 30 anos para curtir a vida? Ou trabalhar até os 60 anos e curtir apenas 3 anos de vida?

Respostas de 16

  1. AoT!!!
    Adorei seu texto! No meu caso já atingimos a meta FIRE, mas com uma criança meu marido e eu nos sentimos inseguros em parar de acumular e passar a “consumir” nossas reservas. Somos FI mas nos falta coragem para o early retirement.
    Me identifiquei com seu texto, nós dois temos profissões valorizadas e bem remuneradas.
    Mas somos frugais. Aliás sempre fomos…mas o tal do golden handcuffs, no nosso caso nos prendem aos nossos empregos…
    sempre comento aqui em casa q nos exigirá coragem para rompe las
    Muito difícil deixar para trás o auge de uma carreira com boa remuneração.
    Vc tem minha admiração!!!

    1. Oi LadyFIRE!

      Que comentário incrível! A coisa mais gostosa de ter esse blog é ler esses comentários e ver que tem pessoas parecidas comigo por aí!

      Eu te entendo sobre o medo de largar uma carreira no auge. Eu pedi demissão depois de receber o maior bônus da minha vida!
      Mas na hora que ele foi anunciado, eu já tinha comprado o trailer, a viagem pelo Brasil já estava programada e meu marido já tinha pedido demissão. Assim o custo de continuar trabalhando ficou muito alto!

      Eu gosto muito da vida de aposentada precoce. Às vezes vou almoçar com amigos que ainda estão trabalhando no mercado e eles vem se gabar para mim sobre o último bônus que receberam. É instintivo sentir certa “inveja” na hora. Mas quando termina o almoço e eu vou para o parque (ou para piscina, agora que está verão!) enquanto eu sei que eles vão voltar para o escritório, a inveja passa rapidinho.

      A sensação de liberdade que eu tenho agora é o maior bem que eu tenho na vida.
      Como eu li numa plaquinha uma vez “depois de provar a liberdade em barril, você não quer só mais uma dose”.

      Espero que um dia, e em breve, vocês se permitam viver essa liberdade!

      Beijo ;)

  2. Este texto foi perfeito, até salvei aqui! Me lembrou daqueles documentários dos Minimalistas e também daquele video do Rato e da Felicidade, você já viu? Eu os revejo de tempos em tempos quando digo que tô caindo na “roda do sistema” rs….Descobri que não sou FIRE porque já tenho 40, será que tem um nome pra minha geração? rs, um beijo e parabéns pelo blog :) tô adorando

  3. Oi AP30

    Pegando o gancho do texto, vou fazer mais uma pergunta. Dinheiro traz felicidade?

    Não sei se já leu a respeito. Existem estudos sobre isso.

    Mais um excelente Post. Parabéns!

    1. Oi Paulo!

      Eu não acho que dinheiro traz felicidade. É claro que precisamos de um mínimo para subsistências, mas para os leitores desse blog (que sabem ler, tem acesso a internet e conhecem o suficiente de finanças para chegar nesse blog), acreditar que dinheiro traz felicidade não faz sentido. Dinheiro compra prazer, e prazer é uma felicidade que não dura!

  4. Seu texto é carregado de conceitos pré concebidos, nem sempre quem tem dinheiro o tem porque herdou, sua visão é a predominante num país de pessoas atrasadas e invejosas, reveja isso, da maneira que escreveu parece inveja .

  5. Mais um post muito legal… Quem tem interesse em FIRE e no minimalismo se identifica muito com o que foi descrito. Perceber que o grau de felicidade não é proporcional ao quanto se gasta comprando ou fazendo alguma coisa é um caminho sem volta. A vida fica mais feliz, leve e econômica!

  6. Num caso como o desse seu amigo, que não aceita “viver com pouco”, o que é o “viver com muito”? De que faixa salarial estamos falando para sustentar esse estilo de vida?
    Pelo que vejo, eu vivo numa faixa próxima à sua, AoT, porém ainda não independente, e já acho isso bastante dinheiro para o padrão brasileiro.

    1. Oi Macunaíma!
      Para mim não é uma questão de quanto você gasta. E sim de gastar com luxos ou confortos que nós tornam fracos e financeiramente dependentes.
      Brasil é muito grande, tem muitas realidades diferentes, então sempre difícil pensar em termos nominais. É uma questão relativa!

  7. Olá AoT, bom dia

    Gostei muito desse post. Eu também compartilho da sua opinião de ter a independência financeira mais cedo do que aproveitar apenas 5% (ou menos da vida). O tempo é finito, mas percebo que a maioria das pessoas acredita que não.

    Tenho alguns conhecidos “cabeças brancas” que estão com a família criada (filhos formados), casa quitada, carrão na garagem, aposentadoria publica, boa aposentadoria privada e um patrimônio muito confortável.

    Porem, ainda insistem em trabalhar de segunda-sexta, no começo eu acreditava que era o prazer do trabalho, não posso mentir, esses “cabeças brancas” são muito bons no que fazem e percebe-se o prazer na realização do trabalho bem-feito.

    Mas hoje percebo que inflaram tanto o estilo de vida que preferem algumas algemas de ouro e até uma cela dourada para manter essa “segurança financeira”.

    Não sou contra eles trabalharem, pois percebo muito bem a experiência e profissionalismo de cada um deles. O que eu sugiro é diminuir o ritmo de trabalho e aumentar o de lazer: dedicar menos horas por semana/mês, trabalhar uma semana e folgar 7 semanas, dentre outras possibilidades.

    Abraços,

    1. Oi VAR!
      Interessante seu complemento do meu post.
      Ter um trabalho para algumas pessoas significa ter um sentido na vida. Tenho um grande amigo que percebeu que já tinha dinheiro o suficiente para parar e não aguentar mais os estresses da vida de trabalho. Mas ele se preparou apenas financeiramente para isso, e não mentalmente. A gente conversa muito porque ele não entende como eu consegui abraçar o estilo de vida “minha profissão não me define”.
      A real é que eu me sinto como no filme Matrix. Depois que eu tomei a pílula vermelha, foi um caminho sem volta. Para mim, um trabalho que te obriga estar lá determinadas horas e dias, é algo que limita sua liberdade. E sem liberdade a vida não tem a intensidade que ela precisa. Não é só uma questão de lazer, é uma questão de ter tempo para vive a vida no seu máximo potencial. Uma pena que eles já são “cabeça branca” e ainda não enxergaram isso.
      Beijos!

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